A tarde desta quarta-feira (5) foi marcada por um acidente preocupante no Centro Histórico de Salvador: parte do teto da Igreja de São Francisco, uma das mais importantes expressões do barroco brasileiro, desabou. Uma turista de 26 anos morreu e outras seis pessoas ficaram feridas.

Entre as ruelas de pedra do Pelourinho, em Salvador, o monumento é uma das joias mais impressionantes da arquitetura barroca no Brasil. Conhecida por sua riqueza de detalhes, talhas douradas e azulejaria portuguesa, a igreja é um verdadeiro testemunho da influência da arte sacra europeia no Brasil colonial.

Foto: Divulgação/Arquidioce de Salvador

A história do conjunto franciscano na capital baiana remonta a 1585, quando os primeiros frades franciscanos chegaram à cidade. No entanto, a construção da atual igreja só começou um século depois, em 1686, e se estendeu até 1723, com aprimoramentos que se prolongaram por mais algumas décadas.

O terreno escolhido para a edificação apresentava desafios, por estar localizado em um declive acentuado. Para viabilizar a construção, foi necessário um trabalho extenso de aterro e nivelamento do solo, além da criação de uma estrutura de sustentação robusta. O esforço valeu a pena: o templo ergueu-se como um dos mais luxuosos do Brasil.

A grandiosidade da obra é evidente desde sua fachada, que segue o modelo maneirista português, com influências da arquitetura religiosa de Coimbra. No entanto, é ao cruzar as portas da igreja que o visitante se depara com um espetáculo único: uma profusão de talhas douradas cobrindo colunas, altares e forros, em um dos interiores mais suntuosos da arte sacra nacional.

O esplendor do interior

A Igreja de São Francisco é um dos exemplos mais expressivos do barroco dourado, um estilo caracterizado pelo uso intenso da madeira entalhada revestida com folhas de ouro. O douramento das talhas foi realizado entre os séculos XVII e XVIII, exigindo um trabalho minucioso de artistas e artesãos.

Foto: Divulgação/Arquidioce de Salvador

Os retábulos laterais e o altar-mor são ricamente ornamentados, apresentando figuras de anjos, santos e elementos fitomorfos. A capela-mor, finalizada em 1723, exibe uma composição majestosa com colunas torcidas e imagens sacras, destacando-se a figura de São Francisco de Assis, padroeiro da ordem.

O teto da nave principal, que desabou nesta quarta-feira (5), era uma verdadeira obra de arte. Composto por painéis pintados, apresenta cenas da vida de São Francisco e alegorias cristãs. Já no claustro do convento, o visitante encontra uma coleção impressionante de azulejos portugueses do século XVIII, com painéis que narram passagens bíblicas e textos filosóficos.

Foto: Reprodução

Contradições entre luxo e simplicidade

Curiosamente, apesar da riqueza artística do templo, a Ordem Franciscana sempre pregou a humildade e a simplicidade, seguindo os ensinamentos de São Francisco de Assis. Essa aparente contradição gerou debates ao longo dos séculos. No século XVIII, frades capuchinhos italianos criticaram a ostentação da igreja, e, no século XIX, missionários franciscanos alemães tentaram eliminar parte do douramento das talhas, sem sucesso.

Enquanto a igreja reluz com ouro e detalhes refinados, os dormitórios dos frades no convento permanecem fiéis à tradição franciscana, com espaços modestos, mobiliário simples e poucas decorações. Esse contraste reflete a dualidade da presença franciscana no Brasil: a busca pela contemplação e espiritualidade aliada à valorização da arte sacra como meio de evangelização.

Foto: Divulgação/Arquidioce de Salvador

A importância da Igreja de São Francisco para a história brasileira

A monumentalidade da Igreja e Convento de São Francisco a tornou um dos maiores símbolos do período colonial brasileiro. Seu valor artístico e histórico é reconhecido internacionalmente, e o conjunto foi incluído na lista das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo. Além disso, faz parte do Patrimônio da Humanidade da Unesco desde 1985, integrando o conjunto arquitetônico do Centro Histórico de Salvador.

Ao longo dos séculos, a igreja resistiu a desafios naturais e humanos, incluindo terremotos, infiltrações e reformas mal executadas. Diversos projetos de restauração foram realizados para preservar seus elementos originais, garantindo que sua beleza e história permaneçam acessíveis às gerações futuras.

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